«De facto, as crianças em idade escolar são o grupo mais afetado pelo Pediculus humanus capitis (vulgo piolho da cabeça). Estes parasitas, de cor castanho-acinzentado, medem cerca de 2,5 mm de comprimento.
Como é possível que um ser
tão pequeno seja capaz de causar semelhante "dor de cabeça" a pais e
professores? E sobretudo uma comichão intensa no couro cabeludo das
crianças?! De facto, as crianças em idade escolar são o grupo mais
afetado pelo Pediculus humanus capitis (vulgo piolho da
cabeça). Estes parasitas, de cor castanho-acinzentado, medem cerca de
2,5 mm de comprimento. Eles fixam os seus ovos aos fios de cabelo, perto
do couro cabeludo, por uma substância pegajosa, assumindo a forma
vulgarmente conhecida como lêndea.
O regresso às aulas, devido
ao contacto mais próximo entre as crianças, é a altura do ano mais
propícia ao contágio. Este é feito mais frequentemente por contacto
interpessoal próximo (cabeça-a-cabeça), mas também é comum a transmissão
através da partilha de chapéus, escovas e outros objetos pessoais de
pessoas contaminadas. O simples ato de pendurar a roupa (infetada) junto
de outra no bengaleiro da escola é o suficiente para fazer proliferar
esta 'praga' num estabelecimento de ensino e mesmo dentro das próprias
famílias. E se pensa que este "mal" nunca vai acontecer ao seu filho
porque higiene é coisa que não falta lá em casa, está enganado!
A
pediculose afeta tanto cabeças limpas como pouco limpas, crianças
pobres ou crianças de classe média e alta, cabelos curtos ou compridos. O
piolho necessita de uma superfície com cabelo para sobreviver, sendo,
fora do hospedeiro, viável apenas durante 48 horas e a lêndea durante 10
dias. Apesar de o cabelo curto ser menos convidativo para estes
parasitas, ele não é, por si só, uma proteção segura contra estes
minúsculos insetos. Então, o que fazer?
Em primeiro lugar, é
essencial não ter vergonha de falar neste assunto e acima de tudo saber
que piolhos não são sinónimo de falta de higiene. O melhor aliado dos
piolhos é o silêncio que se faz à sua volta por, ainda hoje, ser
considerado por muitos um assunto tabu. É muito importante avisar a
escola se chegar à conclusão que o seu filho trouxe para casa uma série
de novos "amiguinhos" pendurados no cabelo. Por outro lado, os
responsáveis pelo estabelecimento de ensino têm obrigação de comunicar
aos pais se verificarem o aparecimento de um surto de pediculose. Só
assim é possível cortar o mal pela raiz e pôr em prática o tratamento
adequado.
A comichão intensa e a irritação da pele da cabeça são
os sinais clínicos mais preponderantes, que é mais evidente na região da
nuca e atrás das orelhas. Infelizmente, quando a infestação é detetada,
geralmente já dura há várias semanas.Uma maneira simples de
perceber há quanto tempo os parasitas estão no hospedeiro é medir a
distância das lêndeas do couro cabeludo. Sabendo que o cabelo cresce em
média 1 cm por mês, as lêndeas afastadas mais de 2 cm do escalpe indicam
mais de dois meses de postura. É difícil encontrar um piolho vivo,
visto que estes insetos se movem com muita rapidez. Por isso, o
diagnóstico é feito mais vezes através da existência dos seus ovos
(lêndeas), de cor branco-nacarado, com cerca de 0,8 mm e firmemente
agarrados à haste do cabelo. Um problema que se põe é distinguir outras
situações que podem simular a pediculose, como a caspa, a seborreia ou
produtos para o cabelo de uso comum, como o vulgar gel. Estes
distinguem-se das lêndeas porque são fáceis de remover com as pontas dos
dedos.
O piolho alimenta-se de sangue e por isso começa por
morder a pele da cabeça. Esta mordedura não causa dor por si só, mas
quando está a sugar o sangue, este inseto expele saliva, a qual tem
características alergizantes. Isto causa inflamação da pele da cabeça e
uma intensa comichão. Ao coçar-se, o indivíduo faz com que as fezes do
piolho entrem nas feridas, o que aumenta ainda mais a inflamação e a
comichão. Este ciclo vicioso pode levar à infeção secundária por
bactérias destas lesões, levando por vezes ao aparecimento de gânglios
no pescoço. Muitas vezes, a criança passa a noite inteira a coçar-se,
dorme mal e vai para a escola muito sonolenta. Claro está que com sono e
muita comichão é difícil estar com a concentração adequada nas aulas.
Por isso, há quem fale na relação causa-efeito da pediculose e baixo
rendimento escolar.
Tratamento
No
que diz respeito ao tratamento, existem vários inseticidas na forma de
champôs ou cremes de lavagem que são bastante eficazes na eliminação de
piolhos e lêndeas. Uma vez que o período de incubação dos ovos do piolho
varia de 6 a 10 dias, após a primeira aplicação, esses medicamentos
devem ser aplicados novamente dentro de uma ou duas semanas para atingir
os parasitas que tenham aparecido entretanto.
A maioria das
respostas insuficientes ao tratamento é devida à má técnica empregue ou à
falta de repetição do tratamento em tempo útil. Existem, no entanto,
evidências do aparecimento de resistências aos inseticidas. Como medida
adjuvante, é importante usar uma solução de mistura de vinagre e água
(deixar atuar durante meia hora) ao pentear os cabelos com um pente de
dentes apertados. É que as lêndeas são muito difíceis de remover e o
vinagre é usado para amolecer a substância que fixa firmemente as
lêndeas aos fios de cabelos. Este procedimento deve ser repetido
diariamente durante vários dias.
Mesmo quando já não parecer
existirem mais piolhos, é prudente examinar o cabelo uma vez por semana.
Os pais devem saber que a comichão pode durar semanas após um
tratamento bem sucedido. É importante sublinhar este facto, pois
tratamentos repetidos podem ocasionar uma dermatite de contacto. A
maioria destes produtos é irritante para a pele que já de si está
irritada e inflamada devido à ação da saliva e das fezes dos parasitas
nas feridas.
As lêndeas são muito sensíveis ao calor e por isso
as roupas de cama e de corpo devem ser lavadas com água bem quente e
passadas a ferro a altas temperaturas. Chapéus, roupas e outros objetos
que não possam ser tratados pelo calor, devem ser selados num saco de
plástico durante quatro semanas; qualquer piolho que tenha eclodido
durante este período morrerá de fome. O ambiente deve ser aspirado com
aparelho a vácuo. Não é aconselhável o uso de inseticidas para o
ambiente.
Todos os membros do agregado familiar devem ser
tratados ao mesmo tempo para erradicar a infestação. Por vezes surgem
dúvidas quanto à necessidade de tratar os animais domésticos. O
tratamento é completamente desnecessário pois o piolho não se transmite
aos animais.
Finalmente, põe-se a questão da proibição ou não de
frequentar a escola durante a infestação. Em Portugal, cada
estabelecimento de ensino dita as suas próprias regras, pois este é um
assunto discutível. Se por um lado é importante afastar a criança dos
outros alunos para evitar a transmissão contínua, por outro convém
lembrar que quando se identifica o problema, a criança já tem piolhos há
várias semanas. Mais uma vez se lembra que o facto de o seu filho ser
afastado da escola por uns dias não significa que a família tenha falta
de higiene; significa, simplesmente, que os responsáveis da escola
pretendem minimizar o número de crianças infestadas.»
Gabriela Marques Pereira, interna complementar de Pediatria, em: http://www.educare.pt/educare/Opiniao.Artigo.aspx?contentid=1037623119303A1FE0440003BA2C8E70&opsel=2&channelid=0